Adorei esse texto... me fez lembrar das aulas de capacitação pedagógica...

Pois É, Pois Sim, Pois Não
A americana estava há pouco tempo no Brasil. Queria aprender o português depressa, por isto prestava muita atenção em tudo o que os outros diziam. Eram daquelas americanas que prestam muita atenção.
Achava curioso, por exemplo, o « pois é ». Volta e meia, quando falava com brasileiros, ouvia o « pois é ». Era uma maneira tipicamente brasileira de não ficar quieto e ao mesmo tempo não dizer nada. Quando não sabia o que dizer, ou sabia e tinha preguiça, o brasileiro dizia « pois é ». Ela não aguentava mais o « pois é ».
Também tinha dificuldade com o « pois sim » e « o pois não ».
Uma vez quis saber se podia me perguntar uma coisa.
- Pois não – disse eu, polidamente.
- É, exatamente isso ! O que quer dizer « pois não » ?
- Bom. Você me perguntou se podia fazer uma pergunta. Eu disse «pois não ».
Quer dizer pode, esteja à vontade, estou ouvindo, estou às suas ordens… »
- Em outras palavras, quer dizer « sim » ?
- É.
- Então por que não se diz « pois sim » !
- Porque « pois sim » quer dizer « não ».
- O quê !
- Se você disser alguma coisa que não é verdade, com a qual não concordo, ou acho difícil de acreditar, eu digo « pois sim ».
- Que significa « pois não » ?
- Sim. Isto é não. Porque «pois não »...significa sim .
- Por quê ?
- Porque o « pois », no caso... dá o sentido contrário, entende ? Quando se diz «pois não », está-se dizendo que seria impossível, no caso dizer « não ». Seria inconcebível dizer « não ». Eu dizer não ? Aqui, ó.
- Onde ?
- Nada. Esquece. Já « pois sim » quer dizer « ora, sim ! ». « Ora se vou aceitar isso. » Ora não me faça rir. Rá, rá, rá. »
- « Pois » quer dizer « ora » ?
- Ahn…mais ou menos.
- Que língua !
Eu quase disse : « E vocês, que escrevem « tough » e dizem « taf’ ? » mas me contive. Afinal as intenções dela eram boas. Queria aprender.
Ela insistiu.
- Seria mais fácil não dizer o « pois »
- Eu já estava com preguiça. !
- Pois é.
- Não me diz « pois é »
Luís Fernando Veríssimo
Comédias para se ler na escola
Ed.D.Quixote.pp 43-44

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Comentário de Evaldo em 6 fevereiro 2012 às 14:50

Sim, bem legal. A gente naturaliza uma linguagem e depois nem se dá conta de qual a sua lógica. Ela se perde na cultura e nos costumes.

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